Bielas Roletadas "by Roesner"    

texto original de Renato Roesner (Joinville/SC), com comentários de Helio Marques (Niterói/RJ)

Tenho um Belcar 66. Na lataria, por enquanto, não vou fazer muita coisa, mas na mecânica...

Tudo que tenho no estoque ou que foi adquirido "zero" está sendo instalado. O que não foi possível colocar novo, meu cunhado (torneiro) está fazendo para mim...

Até as bobinas Lucas (diâmetro original) já foram importadas. O motor é Mahle 76mm com acerto de janelas, bielas roletadas “by Roesner” e rolamentos com dupla blindagem.

Estas bielas “feitas por mim” são, na verdade, bielas retrabalhadas para receber o rolamento de agulhas NK 30/20. É um rolamento industrial, para umas 12 mil rotações. Mas há que ter cuidado, pois existem no mercado modelos com separador de nylon, que não servem, tem que ser com separador de aço.

Já o pino para este rolamento (que é vendido a metro) tem 30 mm de diâmetro e suas pontas são rebaixadas para medida std ou sm (conforme a necessidade).

No "pé da biela" é feito um furo de uns 5 mm escareado (em cada lado), para ajudar na lubrificação, já que este rolamento tem um canal para isto, na capa externa.

Também é necessário fazer o "canal de fluxo" no rolamento, acompanhando já o canal existente na biela. Para isto, eu recomendo desmontar o rolamento, o que é possível de se fazer, através do furo de lubrificação.

E quando fizer o "canal de fluxo", cuidar para não remover por completo a "beirada" do rolamento.

Seguem fotos das bielas e também de um virabrequim já montado.
 
 

 

Helio:

Muito bom o artigo. Essa solução funciona muito bem, porem tem alguns detalhes que eu gostaria que o Roesner comentasse.
1) A abertura do pé da biela em retífica de precisão. Quanto de interferência?
2) A necessidade de cola Locktite 660 entre a capa do rolamento e a biela para contacto total para a transferência térmica e aumento da superfície de pega.
3) A dureza do revestimento no pino, na região do contacto dos roletes com a pista.
Porque peço os comentários dele; porque embora seja uma solução "simples" exige uma série de cuidados para que haja durabilidade e segurança da adaptação. Com a palavra o mestre Roesner.

 

Roesner:

A interferência não sei precisar, pois deixei por conta do torneiro, mas não pode ser muito, para não "enforcar", pois o rolamento vai prensando dentro da biela, sem necessidade de usar cola. A dureza do pino está em torno de 60RC.

 

Helio:

A cola é necessária pelas duas razoes que eu mencionei; segundo os técnicos, o encaixe entre peças não ultrapassa 30% da superfície de contato, daí a necessidade de preencher o espaço vazio. Melhora a condução térmica e evita que as vibrações naturais possam ir deslocando a capa da sede. A cola é aquela para a fixação definitiva de parafusos e foi desenvolvida justamente para preencher espaço vazio. Agüenta temperaturas altas. Seria interessante ir acompanhando com o torneiro a interferência, porque, se muita, solta e, se pouca, força a biela desnecessariamente - tem acontecido com outros amigos, do rolamento soltar! É fundamental a gente chegar a uma interferência de consenso e conhecida para dar mais segurança aos trabalhos. Cautela e caldo de galinha não faz mal a ninguém!
É o mesmo problema, porque estamos usando rolamento C3 em vez de C5. Essa diferença de aperto poderia ser descontada no pino. Mas quanto exatamente? Vamos procurar com os engenheiros especializados, que podem nos ajudar com exatidão.

 

Roesner:

O primeiro virabrequim feito por mim com biela roletada, rodou exatos 5 mil quilômetros na minha ex-Pracinha e depois desmontei tudo para ver como estava, antes de usar este recurso para outros. O conjunto estava tão zerado, que eu remontei tudo e guardei. Hoje está instalado no meu Belcar, que está na restauração. Mas houve dois casos em que foi usado cola. Um por que o torneiro deixou praticamente sem interferência, então por precaução foi usado cola. No outro caso, o motivo foi outro: usamos outro tipo de rolamento NK, um que já vem com a capa interna junto, que é "colado" sobre um pino feito sob medida. E como esta capa é uma "casca", não existe muita margem para interferência, pois enforcaria o conjunto todo. Até hoje não soube de nenhum caso em que o rolamento tivesse soltado da biela. Agora já me aconteceu do pino ficar justo demais, e neste caso, o torneiro dá uma leve brunida no pino para aliviar. Assim que eu falar com ele, vou perguntar de quanto é a interferência.

 

Helio:

Já ouvi falar de três rolamentos que quebraram e soltaram (galinha ou ovo?). A cola, por transferir melhor o calor seria sempre indicada (já que não há como fazer contato, na prática, de toda superfície). A minha preocupação é a "estandardizaçao" das interferências, pino e rolamentos, porque só teríamos a ganhar, já que as experiências se somam. Uma coisa que devemos conscientizar a turma, é que:


1) ESTAMOS FAZENDO A MELHOR ADAPTAÇÃO POSSÍVEL NAS ATUAIS CIRCUNSTANCIAS. Se a gente pudesse comprar todas as peças como o original, ninguém estaria tendo este trabalho;


2) O PROJETO DO NOSSO DKW NÃO ERA PRA ANDAR NAS ESTRADAS A 120 KM /HORA e, com o que temos hoje em dia, há que se redobrar os cuidados. Acredito que mais uns 2 anos estaremos com um conhecimento do motor do DKW como deveria ter sido deixado pela fábrica. É um trabalho de REDESCOBRIMENTO= ARQUEOLOGIA MODERNA;


3) MONTAR E DESMONTAR MOTOR DE DKW NÃO É COISA PRA QUALQUER UM e, se deixada na mão de gente inexperiente, VAI DAR ZEBRA COM CERTEZA.

 

Roesner:

Este trabalho de "arqueologia" é interessante...mas tem que se ter cuidado, é verdade! Além dos nossos carros não estarem projetados para andar a 120 km/h, o álcool presente na gasolina não é bem vindo.
Portanto, também concordo que é preciso tomar cuidado com a qualidade das peças, folgas, montagem, etc. Para exemplificar, recentemente me trouxeram um virabrequim de Curitiba, para revisar e re-montar. As bielas já vieram com o NK prensado e com pista interna junto. Acabei tendo que condenar todo trabalho já feito pelo torneiro do meu cliente. Estava tudo errado...não fizeram canal de fluxo no NK, bucha de bronze na parte superior ovalizado, sem furos para ajudar na lubrificação ou mesmo uma "leve" rosca para o óleo. O pino da biela foi torneado toscamente, sendo que a pista interna simplesmente passar direto por ele...ou seja, cola, só se fosse aquela para "grandes" folgas...mesmo assim não tive coragem de montar.
Acabamos utilizando bielas da Dekabras...

 

Helio:

Ainda não tive nenhuma experiência com as bielas da DEKABRAS, e estou torcendo para que atendam as necessidades, porque vai diminuir toda a trabalheira da adaptação. Conforme sua experiência revela, quem fez o virabrequim, que acabou na sua mão, não tinha a menor noção de motor 2T, física, técnica ou engenharia mecânica! Usar bucha no pino em motor 1000, não deixar espaço suficiente para a penetração do óleo, sabe-se lá mais o que.
Toda vez que alguém vem comprar pistão da gente, a minha primeira preocupação é quem vai fazer o motor! Sinceramente, se eu não conheço, encho o cara de informações para ele perguntar ao mecânico e de acordo com as respostas, prefiro não vender. Não tenho o menor escrúpulo em dizer pro cara que o mecânico dele não sabe trabalhar e eu não vou arriscar levar a culpa pela incompetência dele.
A turma de uma forma geral, sempre culpa o que está dentro do motor, nunca fora. Em medicina é a mesma coisa, raros são os médicos que informam ao paciente dele que houve infecção pós cirúrgica, que é um fato que, inevitavelmente ocorre, normalmente, em 2% DE TODAS AS CIRURGIAS NO MUNDO - preferem dizer que A PRÓTESE DEU REJEIÇÃO, como se isso fosse cientificamente possível! Por isto as trocas de informações são tão importantes no nosso caso. Repetir o erro nunca leva a um acerto, por mais que você tente. Se a gente sabe o que não deve fazer, já é um ganho imenso!

 

Roesner:

Se eu for relatar tudo que eu já vi de errado e estranho em alguns motores DKW que eu recebo, daria para escrever um livro!
Isto quando não vem virabrequim "novo" para dar uma revisada... O que mais me revolta, é que eu nunca estudei mecânica, e quem se diz do ramo, faz coisas inacreditáveis... Já montei uns 3 motores com bielas Dekabras, mas é uma pena que só existam para venda na medida STD. Se o motor tiver bielas sob medida, aí a solução é roletada ou então recondicionada.

 

Helio:

Ayrton, existem dois rolamentos que podem ser encaixados no pé da biela, que resolvem o "problema" da retífica da biela no seu pé ou seja aonde elas se fixam no VIRABREQUIM. Como estes rolamentos tem um diâmetro interno ligeiramente inferior que o pino original é necessário que, ao se fazer um novo pino, o seu centro seja um pouco maior e com a folga indicada (chamada de interferência pelos engenheiros). Se não me engano, quem iniciou esta adaptação foi o OSWALDO de Brasília, mecânico extremamente competente e de uma capacidade inventiva fora do comum. Talvez a "ZEMAGUETE" tenha sido a primeira cobaia! Como ele não "esconde o leite", vários outros mecânicos competentes, Cláudio Ribeiro em SP, Eustáquio em MG, Roesner em Joinvile tem dado suas contribuições neste estudo, que tem se revelado um sucesso. Com esta adaptação, bielas antigas podem ser reusadas com sucesso a um custo aceitável. A grande vantagem é que o pé da biela passa a utilizar superfícies de rodagem novas e feitas para isto!
Os Argentinos montam uma luva no pé e outra no topo da biela, e usam os mesmos roletes originais. O problema é a têmpera e a fixação desta luvas, que resultam em virabrequins que não tem uma durabilidade adequada (talvez funcione melhor lá, porque a temperatura externa é mais favorável, gasolina pura). O Graciano em P.Alegre tem usado com sucesso, lá no clima frio, estas luvas. Aqui pelo Brasil sudeste e norte, com o álcool e mais o calor, talvez a coisa fique mais critica e estas adaptações em luva não durem tanto. O ideal seria a produção de novas bielas, que é coisa cara e complicada (mais do que PISTÃO rsrsssr).
Por isto, as trocas de informações entre os mecânicos e usuários são tão importantes para que nossos carros fiquem cada vez mais confiáveis. Os pinos que você comprou, podem servir para esta adaptação, mas não se sabe qual foi o tratamento térmico que foi empregado na sua superfície de contato com os roletes. Pergunte a quem te vendeu, mas o meu conselho a todos é de se evitar comprar estas peças moveis que são da parte interna do motor, a não ser que sejam originais VEMAG e nunca usadas. A melhor pessoa para escolher as peças é o mecânico que tem realmente experiência com montagem e desmontagem de motores DKW.

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